Esta coluna é destinada a entrevistas com especialistas, gestores, executivos e empresários de destaque.
Segue abaixo a entrevista de Monica Barg.
PME NEWS – Qual a diferença entre trabalho e emprego?
Monica Barg – O emprego pressupõe uma relação entre empregador/empregado que é uma tratativa formal e organizada na qual o colaborador é remunerado para realizar tarefas específicas. Já o trabalho está ligado a atividades produtivas e tudo que se produz é trabalho. O trabalho voluntário exemplifica bem isto. Assim, o trabalho também pode ser composto de várias atividades produtivas sejam estas remuneradas ou não.
Na nossa cultura fomos acostumados a confundir o trabalho com o emprego enquanto ter um emprego é tão somente uma das formas de trabalho, aquela mais organizada tanto social quanto empresarialmente.
Muitos profissionais têm grande dificuldade de identificar formas de trabalho que não seja o emprego “tradicional”, como conhecemos, estamos no meio desta transição em que cada vez mais a atividade produtiva é que fará a construção da carreira e não somente o emprego. Com esta transformação, a Empregabilidade, ou seja, a capacidade de se manter empregável, talvez esteja mais próxima da trabalhabilidade, a capacidade de ser produtivo.
PME NEWS – Qual é o impacto da reforma trabalhista para as Pequenas Empresas?
Monica Barg – A reforma trabalhista traz timidamente mudanças que são consideradas perdas sociais em relação à CLT, mas é extremamente necessária uma adequação para a forma que se trabalha hoje no mundo. Precisamos olhar separadamente para o Brasil em crise e as mudanças estruturais da nova economia. Mesmo em países onde a legislação trabalhista é mais recente, é necessária uma adequação, já que as mudanças tecnológicas e sociais avançaram muito rapidamente.
O trabalho Intermitente, Remoto (Home Office) e a Terceirização são os pontos que podem ajudar as pequenas e médias empresas a terem mais alternativas, custos reduzidos e a gerarem valor na economia. O trabalho em rede, ou seja, por projetos, durante um determinado período e atendendo às necessidades da empresa com competências específicas.
Estamos vendo as PMEs utilizarem este formato ainda de maneira tímida, a mudança de mentalidade ainda está em curso acompanhada da lentidão ocasionada pela crise e ainda o fato de que somos muitos relacionais, ou seja, preferimos as relações de longo prazo em se é amigo ou até parente do colega de trabalho. Assim as contratações eventuais ainda estão em adaptação, tendem a aumentar quando o empresário validar custos e benefícios nos resultados a médio prazo.
PME NEWS – Como as empresas devem preparar os funcionários jovens para assumir os cargos estratégicos?
Monica Barg – A resposta está em construção, o ambiente atual é o novo mundo VUCA (Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo). Para o trabalho em rede, posições estratégicas terão de liderar, inspirar e motivar times multidisciplinares e muitas vezes multiculturais.
Assim as competências exigidas deixam de ser somente técnico-funcionais e passam a ser de comportamento e relacionamento. Lidar com a ambiguidade, diversidade, capacidade de construir soluções será necessário para esse novo contexto.
Em atendimento lido com jovens líderes buscando capacitar-se para este desafio e “os menos jovens” para buscar estas novas exigências. A Leitura e informação diversificadas são o caminho para a construção destas competências que não estão consolidadas ainda em cursos e universidades. Acredito ainda que a melhor forma de se preparar é fazendo, tudo aquilo que for levado para prática poderá ser testado, pensado e reformulado. Pode parecer que falta de conceito, porém, esta geração é a da prática, da velocidade, produtos e serviços hoje já são concebidos em lançamento com a participação do mercado. Assim para ser estratégico é necessário curiosidade, coragem e muita ação. Ninguém mais dirá o que fazer, portanto: Vai lá e faz!
PME NEWS – Qual o perfil de profissional que se destaca no cenário PME, o generalista ou o especialista?
Monica Barg – Próximo do que mencionei anteriormente, o mercado está mudando muito mais rápido do que o ensino acadêmico. O especialista será sempre valorizado, mas, neste momento, a distância da especialidade para a prática é muito grande e, adicionalmente, algumas especialidades deixarão de existir com a evolução da robótica e inteligência artificial. Não sabemos ainda o alcance destas mudanças, ou seja, os conceitos estão em revisão. Se olharmos para 3, 5, 10 anos atrás as mudanças são enormes e aquilo que atendia ao cenário empresarial não se aplica mais.
Temas desejados nas competências do generalista ampliaram-se e mudaram completamente o perfil. Assim, competências como visão sistêmica, adaptabilidade e capacidade de lidar com a ambiguidade fazem o generalista mais atraente para este momento de mudanças significativas.
Futuramente, para grande maioria dos temas, esta divisão entre generalista e especialista deixará de existir e caminharemos para uma combinação de Hard Stills e Soft Stills, ou seja, competências técnicas e comportamentais que juntas compõem o perfil desejado.
PME NEWS – Com a automatização cada vez mais presente no mercado de trabalho, quais profissões se evidenciam e quais sumirão em breve?
Monica Barg – Já é realidade, humanos e robôs trabalhando no mesmo ambiente, as atividades repetitivas e padronizadas por óbvio tendem a ser substituídas e a inteligência artificial trará uma nova forma de trabalho para outras áreas como a jurídica, por exemplo, em que a busca de informação e conteúdo será feita roboticamente.
Assim, os temas nos quais o profissional se conecta será o mais importante, porém, a forma de trabalhar será outra, exigindo novas competências. Teremos atividades de advogados, jornalistas que tendem a se modificar exigindo habilidades mais específicas que não podem ser feitas pelas máquinas: a personalização, o relacional e análise crítica e contextual serão de extrema importância, enquanto a pesquisa, compilação e organização de dados, leitura e redação poderão ser feitas mecanicamente. Com este raciocínio trabalhos como os de intermediação e análise padronizada tendem a desaparecer, eliminando atividades como corretagem, análise de crédito, orçamentistas.
A tendência para as profissões do futuro é se ligar mais a temas que atividades, dada a indefinição da estrutura mercadológica e empresarial. Podemos dizer que todos os temas ligados ao meio ambiente e sustentabilidade estarão em ampliação além deste, qualidade de vida, logística, desenvolvimento humano são algumas das apostas “humanas” para o futuro robótico.
PME NEWS – Quais estratégias e métodos podem ajudar o profissional a desenvolver uma carreira de sucesso em uma mesma empresa?
Monica Barg – Falamos de empregabilidade, trabalho em rede e novas competências, então o que seria uma carreira de sucesso? Diante das mudanças, a busca é de evolução, uma sucessão de atividades produtivas com resultados para as duas partes. A partir daí pode ser em uma mesma empresa seja em várias. Vemos que o colaborador prefere buscar uma nova empresa a tentar uma alternativa na mesma organização e, por outro lado, a empresa desconhece as competências do time e busca soluções no mercado. Criam-se rótulos e as possibilidades de evolução se fecham. O desafio organizacional é ter seu Banco de Talentos atualizado, isto é, quais são os interesses? O que tem lido, visto e se interessado e aí pode estar uma oportunidade de aproveitar este talento.
Já o profissional deve manter a empresa e gestor informados sobre seus interesses e ter uma visão sistêmica. Como exemplos temos o colaborador que vai pelo seu próprio esforço fazer um MBA e não comunica à organização, sim é comum! Ou ainda o colaborador que busca crescimento e não sabe o posicionamento da empresa, faturamento, concorrentes, falta visão sistêmica. Qual a melhor estratégia? Seja curioso, estude, pergunte, estabeleça uma cronologia de ação e vá em frente!
PME NEWS – Que dicas você dá aos jovens que ingressam no mercado de trabalho?
Monica Barg – A dica começa na escolha profissional. Não escolham profissão pela matéria que de gostam ou tem facilidade na escola, pensar somente desta forma sem analisar o perfil pessoal, talentos, forma de trabalho e mercado leva o jovem a uma escolha obtusa com grandes chances de uma interrupção do curso. Para a entrada no mercado é importante que se dê o quanto antes, muitos jovens concentram-se nos estudos e deixam o estágio obrigatório para o final do curso, atuando no mercado a aprendizagem de trabalho e o aproveitamento do curso será ampliado.
Na classe média vejo jovens em múltiplos intercâmbios, emendando cursos sem experiência prática e mesmo com tanta formação acadêmica há a dificuldade de uma primeira colocação, recomendo para pais que estimulem o emprego de verão, atividades operacionais simples, funções burocráticas do dia a dia podem ensinar resiliência, paciência, diversidade e ser uma fonte de aprendizagem.
Aqueles já na universidade busquem programas de carreiras, instituições de estágio, sejam curiosos sobre os negócios que os familiares e amigos têm, as oportunidades existentes na sua rede podem ajudar na construção da carreira.
Por fim, a carreira é sua! Não espere a empresa ou aquela vaga para atuar, a sua marca pessoal será construída pela sua curiosidade, pró-atividade, disciplina e ação. Isto não pode ser terceirizado!