Será que vale a pena gastar um pouco mais do que o básico?
Quando alguém compra um bem que pode ser utilizado para diferentes finalidades, agrega um valor superior que um bem, com uma única finalidade. Do mesmo modo pode se agregar valor, se um objeto puder ser devolvido ou revendido com facilidade. Situações na qual a matéria prima pode ser escolhida ou adaptada a cada caso, também podem ser agregadoras de valor. A possibilidade de ampliar projetos gradualmente pode ser uma forma de estar aberto a situações futuras que venham a gerar valor.
As situações apontadas são corriqueiras na realidade de qualquer pessoa ou empresa, ainda que os tomadores das decisões, muitas vezes, não se deem conta quando o fazem. Exemplos destas situações vão desde a escolha de um forno de micro-ondas, um carro, um celular ou uma casa para pessoas físicas, como para empresas de qualquer tamanho, quando adquirem seus equipamentos. Antes de identificar o que estas situações têm em comum, observe os exemplos:
Situação 1: Ao comprar uma máquina de costura que pode ser utilizada para diferentes tipos de pontos de costura, gera-se assim diversas oportunidades para o seu comprador. Uma empresa, que adquiriu uma máquina de costura “adaptável” para fazer cortinas, pode no futuro aproveitar ou revender para a produção de tapetes, toalhas personalizadas ou mesmo produtos de couro a depender da adaptabilidade do equipamento. Muitas costureiras que faziam bainha, conseguiram produzir máscaras durante a pandemia, porque seus equipamentos faziam costuras diferenciadas. Todavia, equipamentos que tenham somente capacidade de fazer um tipo de costura podem ser até mais baratos, mas não oferecem aos seus detentores várias alternativas no que pode ser produzido.
Situação 2: Existem contratos em que um aparelho de telefone celular é comprado com possibilidade de ser devolvido após um período de teste, permitindo o recebimento do valor integral ou pelo menos um percentual significativo do que foi gasto; nestes casos, o comprador pode até estar disposto a pagar mais caro do que em uma compra que não seja oferecido o direito de devolução. Algumas empresas pagam mais caro por equipamentos, onde haja garantia de mercado no futuro quando não precisarem mais do ativo. A existência de um período de teste ou de uma possibilidade de revenda assegurada pode fazer com que um produto fique mais valorizado. A garantia de “uma porta de saída” pode ser contratual ou dada pela liquidez de determinado produto. É comum carros de determinadas marcas serem mais valorizados por terem a negociação dos usados mais fácil no mercado.
Situação 3: Imagine um criador de galinha que sempre alimentou suas aves com determinado tipo de milho. Ele preparou seus equipamentos, montou silos, criou vínculos com fornecedores locais e selecionou as matrizes dos frangos para dar somente este tipo de alimento. Outro criador sempre alimentou suas aves com rações variadas, ainda que para tanto tivesse um custo um pouco maior. Em um período de alta do preço do milho ou de dificuldade de acesso do fornecedor local (como numa quebra de safra), o primeiro criador terá que incorrer em custos “ao sabor do mercado”, como “importar milho” ou reestruturar a força a sua produção; enquanto, o segundo produtor mudará o balanceamento do alimento que dá as suas aves. Embora o caso dos criadores possa parecer longe da realidade do seu dia a dia, este caso ilustra a diferença que o detentor de um “carro flex” tem em relação a alguém que não o tenha. Por mais que alguém que tenha o “carro flex” diga que nunca colocou álcool no seu carro, ele detém a possibilidade de mudar o seu combustível quando a gasolina estiver significativamente mais cara que o etanol. Exemplos de empresas industriais que podem variar entre produzir com fontes alternativas de energia ou com matérias-primas distintas existem, quando estas ao serem montadas foram planejadas para contingências.
Situação 4: Alguém que constrói uma casa de um piso gastando na fundação um pouco mais, para no futuro construir andares superiores, terá maior facilidade de ampliá-la. A escolha no tipo de fundação deve levar em conta não apenas o custo, mas a possibilidade real de se construir andares acima. É comum certas empresas comprarem terrenos maiores do que precisam na sua formação, para que tenham a possibilidade de expansão no futuro.
A ideia que está embutida em cada situação apontada é de: flexibilidade. Em todos os casos apontados, o dono do bem tem a opção de alterar a situação inicial. A teoria de finanças trata desta lógica denominando-a como Opções Reais. Reconhecer as opções reais existentes nas nossas escolhas e nos contratos é o primeiro passo, a avaliação de cada opção identificada exige uma complexidade que envolve conhecimentos de: probabilidade, valor do dinheiro no tempo, além do entendimento do assunto abordado.
*Oscar Lewandowski.
Atualmente é professor UFRJ/FACC Curso de C. Contábeis. Tendo já lecionado no IBMEC-RJ, UNIFESO e UFF, além de atuado no Mercado Financeiro. Formação como doutor pela FGV EBAPE-RJ, mestrado IBMEC-RJ e graduado como economista na UFRJ-FEA.