Entrevista concedida pela especialista em Empresa Familiar, Sandra Reginada Luz Inacio, ao PME NEWS, edição de Dezembro de 2018 – Tema: “Empresa Familiar e os desafios da gestão à sucessão”.
PME NEWS – Quais são os principais desafios da gestão de uma empresa familiar?
Sandra Regina da Luz Inácio – O maior desafio, não somente para as empresas familiares, mas para todas as empresas em geral é a nova mentalidade exponencial que atinge implacavelmente a forma de gestão dessas empresas, as familiares, que, em sua maioria é acostumada aos padrões tradicionais, trazendo para esta gestão: a descentralização, gestão horizontal, inovação, não linearidade e transparência, aumentando as suas chances de crescimento, mesmo em um contexto socioeconômico não favorável.
As empresas familiares precisam conscientizar-se de que, com a evolução da tecnologia, o seu produto/solução/serviço deve ser colocado no ar, sem precisar contar com servidores físicos, tornando o processo mais simples, atingindo diretamente seu cliente e com um custo inferior.
Com os novos aplicativos: Big Data, cloud computing, robótica, etc. cria-se uma imensa vantagem competitiva em relação aos concorrentes, mercado e clientes, pois a gestão familiar geralmente faz projeções que nem sempre condizem com a realidade.
A mentalidade exponencial gera novas formas de pensar sobre marketing, vendas e estratégia e a maioria dos líderes está acostumada a tomar decisões em vez de capacitar decisões, o desafio é abraçar o desconhecido e “desaprender” as formas familiares de pensar.
PME NEWS – Quais os principais conflitos em um negócio familiar?
Sandra Regina da Luz Inácio
Os principais conflitos surgem quando:
- Os pais acreditam que todos os filhos devem trabalhar na empresa e um ou mais dos filhos, não têm interesse nem aptidão para o negócio.
- Um dos irmãos sente-se desprezado nas decisões da empresa em relação aos demais ou sente que trabalha mais que os outros e deveria ser mais valorizado.
- Filhos que não trabalham na empresa desejam opinar nos negócios e outros membros da família discordam.
- Os filhos constituem suas próprias famílias, agregando novos membros na relação empresa x família, os quais começam a opinar ou trabalhar na empresa.
- As novas gerações desejam alterar a forma como a empresa é gerida e implantar inovações, mas os mais velhos acreditam que “em time que está ganhando não se mexe”.
- Parentes (tios, primos, sobrinhos) são escolhidos para trabalhar na empresa devido ao grau de parentesco, e não pela competência em contribuir com o negócio.
- Há divergência na escolha do sucessor do fundador da empresa.
Sem falar que é inerente aos membros trazerem seus problemas familiares para dentro da empresa, costumo dizer que a gestão emocional tem mais força que a gestão organizacional no caso das empresas familiares.
PME NEWS – Quais foram as principais mudanças adotadas pelas empresas familiares nos últimos anos?
Sandra Regina da Luz Inácio – O e-social, embora ainda não seja obrigatória, mas já está trazendo mudanças, pois as empresas de um modo geral precisam adequar-se.
Outras mudanças ocorreram em função da Reforma Trabalhista, que entrou em vigor em novembro de 2017.
Dentro do cenário inconstante e quase imprevisível brasileiro, as empresas familiares foram obrigadas a adotarem vários tipos de mudanças para poderem sobreviver ao mercado. Desde aumentarem o número de produtos ou serviços oferecidos, entre outras estratégias. A implementação de novos sistemas, controles diversos, implantação de novas rotinas, novos projetos, etc.
PME NEWS – A nova geração está pronta para herdar a gestão das empresas familiares? Como lidar com as diferenças entre as gerações?
Sandra Regina da Luz Inácio – Qualquer geração estará pronta para herdar a gestão de uma empresa familiar, basta ser preparada adequadamente para isso, ser profissionalizada que é o mais importante.
Para lidar hoje com as diferenças e conflitos entre gerações, algumas empresas estão adotando os seguintes recursos:
– Contratando um coach para auxiliar os profissionais para que possam repensar suas atitudes e limitações utilizando perguntas que levem a essa reflexão. Mesmo porque um mix de profissionais de diversas gerações numa mesma equipe com a supervisão de um coach pode dar excelentes resultados e serve para criar um ambiente propício para a criatividade.
– A realização de workshops com dinâmicas em grupo para estimular o espírito de equipe e o autoconhecimento funciona muito bem para acabar com eventuais resistências. Claro que para conseguir melhores resultados, antes de tudo é necessário que a gestão de pessoas mapeie quais os comportamentos que devem ser melhorados na organização para depois atuar.
– Ambientes abertos, onde todos possam estar em um mesmo patamar e sem as velhas paredes também facilitam a integração, estimulam a comunicação interpessoal, desencorajam fofocas e incentivam a troca de experiências.
PME NEWS – Como combater a informalidade nos negócios envolvendo a família?
Sandra Regina da Luz Inácio – A melhor maneira é profissionalizando a empresa, criando seu conselho de administração, conselho de família (caso necessite), comitês, criar um código de ética, fazer a sucessão de forma adequada. Dessa forma, combate-se a informalidade nos negócios e principalmente a empresa perpetuará por muitos e muitos anos.
PME NEWS – Qual o conselho que você dá para quem está começando um negócio familiar?
Sandra Regina da Luz Inácio – Fazer o Acordo Familiar, que é um conjunto de regras e normas que determina como será a relação entre a família, os sócios e a empresa.
Cada família deve definir os itens que constarão em seu Acordo Familiar.
Por exemplo:
- Estabelecer quem vai trabalhar ou não na empresa.
- Definir a responsabilidade de cada um, incluindo na resolução dos problemas.
- Esclarecer o nível de autonomia dos membros.
- Saber como será a utilização dos bens da empresa.
- Definir remuneração em caso de doença ou pensão em caso de falecimento.
- Estabelecer um processo de sucessão.
- Outros fatos que os membros julgarem necessários constar em seu acordo familiar.
É importante que:
- A família discuta cada problema que possa surgir ao longo da existência da empresa e defina em conjunto como resolvê-los.
- Documente por escrito essas decisões prévias para consultá-las sempre que preciso.
- Que todos os membros da família assinem o acordo familiar.
É importante lembrar que os familiares que não trabalham na empresa não recebem salário (pró-labore), mas legalmente têm direitos sobre a empresa. Por isso pode ser importante incluí-los nas grandes decisões do negócio, tanto nas definições do Acordo Familiar quanto do Conselho de Família.