A qualidade nasceu com o ser humano. A primeira roda era quadrada, levou 10 dias em processo de fabricação e tempo de vida de 10 horas. A segunda roda era sextavada, levou 8 dias de fabricação e durou 30 horas em uso. Mas foi na metade do século passado, na terceira revolução industrial, que conhecemos os primeiros gurus da qualidade, Shewhart, Deming, Juran, Ishikawa e Feigenbaum. De lá para cá, inúmeros programas e conceitos foram desenvolvidos até chegarmos no design thinking, lean six sigma, métodos ágeis e scrum, entre outros. Todos tratam de atender aos clientes e manter o negócio duradouro. Porém, nenhum negócio é duradouro se não houver clientes. E, nenhum cliente é duradouro se não o escutar. Para isso, muitas empresas gastam milhares de reais para fazer uma pesquisa de opinião. No entanto, os clientes nos falam gratuitamente e o tempo todo sobre o que pensam do fornecedor. Esse artigo é sobre escutar o cliente e não apenas ouvi-lo.
Um exemplo real aborda uma empresa que fornecia uma parte pequena de um produto ao cliente. No histórico de fornecimento havia reclamações de entrega, de qualidade de produto e reclamações no atendimento. Seguindo o procedimento tradicional, o fornecedor conseguiu, após várias tentativas sem sucesso, marcar uma reunião com o cliente. Nessa reunião, estavam presentes o diretor de operações do fornecedor e o representante de vendas. Pelo cliente, estavam presentes o diretor industrial, gerente de qualidade, coordenador de regulatórios, supervisor de depósito e o diretor de compras. Seguindo o clichê nesses casos, o cenário estava montado para o cliente massacrar o fornecedor. E, foi exatamente o que aconteceu. Como resultado, o fornecedor saiu da reunião nocauteado e com uma lista enorme de problemas para resolver, sob a real ameaça de perder o pouco que já fornecia.
De volta à empresa, a percepção inicial da equipe era de que o tratamento dado pelo cliente, somados à série de imposições, apontava pelo desinteresse do cliente em continuar a parceria. Na lista, além das reclamações, havia novas exigências que sequer eram seguidos pelos concorrentes. Porém, como ocorre em debates em equipes saudáveis, reuniões abertas e liderança positiva, os resultados da reunião foram:
a) O cliente continua interessado. Se não estivessem, não haveria tantas pessoas importantes na reunião. Mandariam apenas um grupo para cumprir o protocolo. Talvez nem haveria reunião.
b) As reclamações feitas pelo cliente eram legitimas. A lista com pedidos e desejos adicionais foram um presente, uma vez que o concorrente não sabe, ou não pode, ou não quer fazer. Chegaram a conclusão que o custo não seria afetado, uma vez que existia ociosidade na máquina. Pelo contrário, o lucro líquido aumentaria com aumento de vendas.
c) Havia um potencial adicional de vendas pelo desenvolvimento de um novo produto. Essa informação foi “pescada” durante a reunião com o cliente.
Com base nesse entendimento, o fornecedor adotou um plano de ação técnico, comercial e integração entre as duas empresas. A estratégia de comunicação, que incluía reuniões periódicas de acompanhamento foi implementada junto ao cliente. Outro ponto fundamental foi a disciplina na execução do plano de ação. Naturalmente, atingiram o resultado estipulado.
Entretanto, para o sucesso do projeto, uma simples decisão foi crucial. De um lado, o fornecedor ouviu do cliente: “Sua empresa não tem futuro, porque tem muitos problemas de atendimento e produto”. Por outro lado, o fornecedor escutou do cliente: “Vocês têm problemas, mas precisamos desesperadamente de um fornecedor confiável e precisamos de vocês”.
Vivemos num mundo que a cada dia aprendemos novas metodologias e novas tecnologias. A sociedade muda constantemente e consequentemente, nossa maneira de interagir. Todo esse processo foi conduzido usando os ensinamentos de qualidade e gestão. E de disciplina na execução. Nos dias atuais, seguramente novas abordagens seriam usadas. Porém, ainda, os ensinamentos mais simples são os mais preciosos. Ouça com atenção e não escute as palavras. A mensagem é a pedra fundamental para definir qualquer plano de ação. Sem a mensagem correta, nenhuma técnica, antiga ou moderna, vai levar aos resultados esperados.